Congado: Canto que Cura, Herança que Resiste
A força do tambor e da fé
Por Eunice Espínola
Publicado em 28/06/2025 02:03
MUNDO NEWS

 

Por Eunice Espínola – Jornalista e Escritora

 

 

Colorido, vibrante e profundamente espiritual, o Congado é uma manifestação cultural e religiosa afro-brasileira que reúne música, dança, devoção e ancestralidade. Muito além de um espetáculo folclórico, o Congado é um ato de fé coletiva, uma memória viva do povo negro e uma expressão de resistência que pulsa no coração do Brasil.

 

Reconhecido oficialmente como Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil pelo IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), o Congado ocupa hoje o lugar de honra que há séculos lhe pertence por direito: o da preservação da história, da religiosidade popular e da identidade afrodescendente.

 

Memória pessoal: quando a fé vira milagre

 

Eu tinha apenas alguns anos. Era uma menina franzina, com amigdalite, corpo febril e um quarto simples onde o cômodo da sala se misturava à cama. Minha mãe, aflita, não sabia o que fazer. Foi quando ouvi os sons se aproximarem: tambores, vozes, fé em forma de música.

 

“Deixa eu ver?”, pedi.

 

“Não, minha filha. O sereno pode piorar sua febre”, disse minha mãe com carinho.

 

Mas insisti:

“Eles vão me curar. Vai ser um milagre.”

 

Minha irmã Eva correu até o cortejo:

“Venham curar minha irmã!”

 

E eles vieram.

 

O Congado entrou em nossa casa como se fosse um sopro de Deus. Cantaram, oraram com seus instrumentos.

E eu dormi. Quando acordei, a febre havia ido embora.

 

Foi ali que entendi: o Congado não é só tradição. É cura.

É fé que bate no ritmo do tambor.

É espiritualidade que dança em nome da resistência.

 

Reconhecimento oficial

 

Em 2022, o Congado foi registrado como Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil. A medida reconhece não só sua relevância cultural, mas também sua função como expressão de fé, identidade comunitária e preservação da memória afro-brasileira.

 

Os cortejos, os festejos e a musicalidade do Congado são heranças ancestrais que ajudam a contar a história de um país ainda marcado pela desigualdade, mas cuja cultura pulsa em cada território de resistência.

 

Por que lembrar?

 

Porque o Brasil precisa honrar o que o constrói.

E o Congado é parte viva dessa construção.

 

A fé, quando cantada, tem o poder de curar, transformar e permanecer.

 

 

️ Eunice Espínola

Jornalista, escritora, fundadora do Instituto Helenas Não Se Calarão, comendadora cultural e ativista pelos direitos humanos e da cultura afro-brasileira. 

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